Você lembra da roçada da OCA? Ação da população ajudou a criar o Bairro Vitória

Casas populares estavam sendo construídas na região e foram abandonadas e tomadas por mato. O Frei Ivo motivou a limpeza do local.

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  • 09 de Janeiro de 2024
  • Frei Ivo - Foto: Arquivo Pessoal/Rádio Capinzal

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Durante o Programa Sete e Meia desta terça-feira, 9, o convidado Avelino Santolin lembrou um fato marcante do final da década de 80 em Dois Vizinhos: a roçada da OCA. Na ocasião, o Frei Ivo Lazzarotto, que atualmente está em Capinzal (SC), convocou todos os fiéis para levarem suas ferramentas na celebração religiosa da quarta-feira de cinzas (dia 17 de fevereiro de 1988). O padre dizia que seria realizada uma grande encenação. Depois da missa, o povo foi levado, em uma grande procissão, a região que era conhecida como OCA (atual Bairro Vitória) onde estavam sendo construídas 204 casas populares que estavam abandonadas e tomadas pelo mato. Toda a sociedade (da cidade e do interior) ajudou na roçada e na conclusão das casas que foram destinadas a famílias em situação vulnerabilidade social. Depois do trabalho feito, o mato foi queimado e as pessoas abençoadas com as cinzas (fazendo o sinal da cruz). O livro tombo da Paróquia Santo Antônio dá conta de que mais de 10 mil pessoas participaram da ação. Todo o trabalho durou 45 minutos.

“O Frei Ivo convidou para que todos trouxessem suas ferramentas de trabalho na missa. Na época, a gente vivia da colônia aqui, todo mundo era colono. Aí ele pediu que a gente levasse a ferramenta para a missa para fazer uma oferta da ferramenta de trabalho. Na hora de começar a missa, ele chamou o povo todo que participava, enchia a igreja, levou nós lá para a OCA, onde hoje é o Bairro Vitória. Lá se chamava OCA porque a Cohapar ficou de construir 84 ou 104 casas ali e a empresa não conseguiu terminar o projeto e virou um matagal. As casas estavam levantadas, faltava a cobertura e as aberturas. Foi passando alguns anos, e o mato tomou conta. O Frei Ivo, na hora da missa, puxou todo mundo pra OCA e falou: nossa missa é aqui hoje. Ele fez a gente roçar todo aquele terreno. A gente tinha uma favela ali atrás do Hospital São Judas e o Frei já tinha programado para destinar as famílias para aquele espaço novo e, por isso, se chama hoje Bairro Vitória. Foi uma missa de foice e facão. Uma roçada e o povo foi assumindo aquelas casas”, lembrou Santolin.

Os ouvintes interagiram com a história. “Eu também vim ajudar a roçar aqui na OCA. Eu morava no interior e nós enchemos um caminhão amarelo e viemos roçar aqui. Depois de um ano que a turma tinha entrado, comprei uma casinha aqui e faz 33 anos que resido no Bairro Vitória. Vim ajudar roçar, comprei e estou aqui até hoje”, destacou Antônio Farias da Silva. 

Claudino Tozetto também participou da roçada. “O padre pediu na missa para quem tinha uma foice levar. Quanto terminou, o padre foi na frente, uma comissão foi atrás e ele nos levou até onde era o terreno. Os homens roçavam e as mulheres e crianças puxavam o mato no meio da estrada. Hoje é o Bairro Vitória. Todas as casas estavam em meio construção e o mato passava por cima das casas”, comenta. Enês Nazário lembra que o Sindicato dos Trabalhadores Rurais auxiliou a convocar as pessoas do interior. “Nós, do São Pedro dos Poloneses, fomos num caminhão que foi cheio de gente e todo mundo ajudou de uma forma ou de outra, seja doando materiais de construção ou ajudando com serviço para terminar as casas pro povo morar”, completa. Ivanir Veloso destaca que seu pai foi funcionário da OCA. “Meu falecido pai trabalhou nessa empresa, a OCA, até 1983. Ele construiu até a casa 10. Ele pediu demissão em 1983. O nome da empresa era OCA, uma construtora, e aí ficou o nome do local como OCA”, completa.

Ivone Vivan, por sua vez, relembrou o início do Bairro Vitória. “Eu, o Marcos (em memória) e Aline, junto com o Frei José, depois que foi tudo encaminhado, a gente fazia o culto embaixo das árvores com uma cruz de madeira. A gente convivia muito com o povo do bairro, com as irmãs, a gente cuidava muito dos doentes lá no Bairro Vitória. Quando eu não conseguia com o meu dinheiro, pedia para as mulheres do Rotary, fizemos móveis, camas, prateleiras. A gente levava quem precisava para o hospital, trazia de volta, depois a gente deu catequese, a primeira Igrejinha foi feita com umas tábuas, era uma casinha para que a gente pudesse dar catequese no coberto. A gente vendia rifa para pagar o pedreiro que fazia o piso. A história foi muito linda, eu gosto muito do Bairro Vitória, maravilhoso”, conclui.

Casas ocupadas...

O livro tombo da Paróquia Santo Antônio ainda destaca que no dia 11 de setembro de 1988 as casas foram invadidas. “Famílias da periferia e das favelas, previamente contatadas, numa operação rápida, de madrugada e sem muita organização, concretizaram a ocupação. No dia seguinte, começou o processo de acusações, no qual mais uma vez os Freis Capuchinhos foram alvo de muitas críticas. A igreja social e a igreja tradicional. Foram momentos de divisão, de posições radicais e extremadas. O clima não era bom, pois os conflitos ideológicos e filosóficos deixavam muita gente à margem do processo, sem conseguir entender o que acontecia. Essa situação levou a outras deveras assustadora, radical e corajosa: os Freis Capuchinhos resolveram fechar as igrejas por 30 dias. Nesse período, nada de missa, batizados ou cultos. A repercussão não foi só local, mas regional e até estadual”, destacou o documento.

Fonte: Portal Educadora